quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Resenha 616: Venom, o filme


A partir de hoje, o filme do Venom está já em boa parte das salas dos cinemas brasileiros, chegando um dia antes do lançamento nos EUA, onde provavelmente vai levar o primeiro lugar do final de semana e potencialmente fazer a melhor estreia de todos os tempos pro mês de outubro. Isso tudo parece muito bom se não fosse um pequeno detalhe - a prevalência das críticas lançadas até agora tem sido de notas baixas. Mas será que Venom é tão ruim assim quanto vendem?

A impressão inicial com o primeiro trailer não foi lá muito boa quando foi lançado sem nenhum indício de simbionte aparecendo para matar a curiosidade dos fãs. Logo se levantou um boato de que o Venom na forma monstrenga como conhecíamos dos quadrinhos não apareceria até o final do filme e tudo se resumiria a momentos de luta em que Eddie lançaria tentáculos e faria bocarras. Isso fez muita gente torcer o nariz e já desistir do longa mesmo com Tom Hardy desmentindo essa afirmação e vários teasers provarem o contrário. E quero te tranquilizar depois de ver o filme que você terá Venom o suficiente para curtir por muitas cenas. Então, qual o problema para notas tão baixas?

Bom, não tenho o que avaliar a expectativa que os críticos tinham até sentar na poltrona da cabine de imprensa, mas é preciso que os fãs que realmente querem aproveitar o filme vão com algumas coisas em mente. A primeira delas é que o filme não foi feito para ser uma obra prima do ramo de super-heróis. Ele foi feito para ser um filme de baixo custo (por volta de 100 milhões), menos que o último Deadpool, e portanto tem todo um jeitão quase independente e experimental. A segunda coisa é que o filme assim como o Homem-Aranha do Raimi, tem bastante assinatura do seu diretor, no caso Ruben Fleischer. Então, esteja preparado para um clima "Zombieland" e "Santa Clarita Diet" com humor negro e alguns momentos muito escrachados. E acredite que tudo isso combinou muito bem com o personagem. Então, se lamentavelmente esse não é seu tipo de filme, fique em casa mesmo. Por fim, a terceira coisa que preciso te dizer (mas não precisaria) é que o filme não vai ter nada a ver com o Homem-Aranha. E mesmo assim funciona muito bem. Por sinal, faz mais de uma década que o personagem nos quadrinhos se desvinculou do herói e segue muito bem com sua mitologia própria.


Dito tudo isso, se você acredita que vale a pena dar ainda assim uma chance ao filme, te garanto boas risadas. O filme se monta até mais ou menos sua metade como um horror sci-fi alienígena, onde um inescrupuloso empresário dono da Fundação Vida, Carlton Drake (Riz Ahmed), vai muito longe em suas pesquisas (tanto em distância quanto em ética) para conseguir um advento que levará a humanidade ao novo passo evolucionário. Acaba trazendo um perigo a Terra quando seu time de astronautas volta do espaço com quatro amostras alienígenas simbióticas. O repórter investigativo Eddie Brock (Tom Hardy) entra na história após seu chefe pedir para fazer uma exclusiva com Drake sobre o acidente, mas ao invés de dar uma matéria padrão sobre a queda do ônibus espacial, Hardy o pressiona sobre os boatos de que Carlton usa cobaias humanos em seus experimentos inescrupulosos. Em retaliação, Drake acaba com a carreira de Eddie e de sua noiva Anne Weying (Michelle Williams), que trabalhava na empresa de advocacia que cuidava dos processos da Fundação Vida. Em meio a isso, temos um simbionte foragido por aí dando uma pontinha pros espectadores verem do que os alienígenas são capazes ao mesmo tempo que rolam alguns experimentos tenebrosos dando errado.

Mesmo sem Venom até aí, o filme não perde ritmo. Ahmed faz como sempre uma atuação exemplar, enquanto que Tom Hardy me surpreende com um veia de comédia situacional que eu não esperava dele. Vale aqui um paranteses para avisar aos leitores que você encontrará uma personalidade bem diferente de Eddie Brock aí. Ao invés do repórter inescrupuloso dos quadrinhos, você se depara com uma figura ousada para conseguir suas matérias, que não tem medo de se meter em confusão, mas ao mesmo tempo não pensa duas vezes em ferrar com seu relacionamento para conseguir informações para sua reportagem com Drake. Calhou da Michelle Williams ficar com a atuação mais a desejar, demorando um pouco para você simpatizar ou achar meramente interessante sua personagem. Acho que só teve uma cena dela que curti no filme, e sequer posso dizer que é mérito dela. E você vai saber do que estou falando quando conferir o filme.


Então, tudo muda quando entramos num segundo ato, onde Eddie Brock vai tentar mais uma vez encontrar provas contra Drake e acaba ganhando um inesperado "parasita" quando invade os laboratórios da Fundação Vida. Tom Hardy, sem fugir da personalidade que criou para este Eddie dos cinemas, nos presenteia com uma atuação extra excepcional quando o personagem passa a ter umas "crises esquizofrênicas" e um comportamento errático em público. Melhora mais ainda quando o alien finalmente se revela como um ser pensante independente pela primeira vez e tem um "blá" com o repórter. A performance de Hardy vai só crescendo no avançar do filme, mais divertida, surpreendente, cheio de momentos hilários com a voz do Venom servindo de "grilo falante" do mal.

A partir daí, todo o brilho do filme está na relação Eddie e Venom, que não é nada amistosa de início  e só coloca-os em apuros, até que ao longo do tempo meio que vão entrando em algum tipo de trégua ou acordo. Perseguidos por seguranças da Fundação Vida, os dois tem a sobrevivência como prioridade, mas talvez o simbionte esteja escondendo algumas verdades do seu "hospedeiro compatível". Em meio a isso, temos bastantes cenas de ação, que inicialmente não são lá exatamente o forte do filme, mas nada desmerecedor também, e melhoram mais no final. Na verdade, a ação acabam saindo um pouco mais do mesmo, ou talvez já tenhamos perdido um pouco o brilho disto depois da Marvel Studios colocar o patamar de qualidade lá em cima. Ainda assim, a sequência da SWAT no hall do prédio do antigo trabalho do Eddie merece um polegar positivo.


Para quem temia se o personagem enfraqueceria sem a presença do Homem-Aranha, saiba que você sequer vai sentir a falta do teioso. Ruben Fleischer foi caridoso ao explicar bem espontaneamente toda a natureza dos simbiontes, da compatibilidade dos hospedeiros as fraquezas da espécie com som e fogo. Tudo isso que é mencionado, vai ter uma função no decorrer da história mais a frente quando um outro Simbionte surge. Sim, temos outro além do Venom e isso não é segredo pra ninguém que viu o segundo trailer. A partir do terceiro ato, Venom toma ares mais heroicos e "Riot" se tornar o grande antagonista do filme. E talvez, esse seja o ponto que mais incomode o espectador, como que do nada Venom passa para o lado dos humanos e vai de encontro a sua própria espécie. Há uma explicação, meio ridícula até, mas ela é te jogada tão rápido que você é obrigado a engolir ligeiro e passar pro próximo momento de ação do filme.


No mais, vale dizer que você vai ter alguns easter eggs surpresas e uma aparição inesperada na história. O filme conta com uma cena pós-credito que praticamente todo mundo já sabe qual é e lá pro final você ganha de brinde mais um trailer de Homem-Aranha: No Aranhaverso. Enfim, Venom é exatamente aquilo que se vendeu, não quer ser megalomaníaco, se diverte como um humor negro que deu muito certo com o casamento do ator, diretor e personagem e ainda mantém bastante raízes com os quadrinhos (ao menos, contando aqui que você realmente leu as histórias solo do personagem nos anos 90). Não é ruim, mas não irá ser algo que fará você falar dele muito por aí. Como falei para algumas pessoas: É melhor que filme de 200 milhões de gasto que nem tem pé e nem cabeça (e não foi o Venom que comeu). Um começo modesto, mas sincero do tal Universo Cinematográfico Marvel da Sony.

Coveiro

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