quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Vingança: Redefinindo conceitos

No último trimestre de 2014, a Panini lançou no Brasil um encadernado especial de Vingança, minissérie escrita por Joe Casey e ilustrada por Nick Dragotta. A bela capa, elaborada por Mike Deodato, era bastante convidativa: ela reunia nada menos que Doutor Destino, Magneto, Loki, Caveira Vermelha, Doutor Octopus e Mercenário, seis dos vilões mais marcantes do Universo Marvel. Talvez muita gente, ao ler o encadernado, se sinta enganada. De fato, a capa não ilustra exatamente o que a história mostra – mas o encadernado traz uma história como poucas vezes se viu...



A verdade é que os seis personagens em questão servem meramente como fio condutor da trama. Alguns são lembrados de forma póstuma, outros já não são mais vilões. Um deles sequer aparece na história, deixando seu herdeiro ocupar seu lugar. O ponto é: Vingança não é uma história sobre personagens consagrados. Vingança é sobre uma nova geração, ansiosa para provar seu valor. Vingança é sobre a eterna reflexão sobre o que é o Bem e o que é o Mal. Vingança é pura psicodelia, tecnologia, é a ação que acontece por trás dos panos e ninguém sabe, é a revelação de segredos que talvez devessem continuar secretos.

Não pretendo contar aqui toda a história da minissérie, apenas dar um contexto inicial para os novos leitores e leitoras. A trama de Vingança gira em torno de duas facções de jovens notáveis: a Brigada Jovem e os Jovens Mestres. O primeiro grupo é a nova geração do antigo grupo de adolescentes liderados por Rick Jones, que buscava informar os super-heróis das ameaças que surgiam pelo mundo – mas a nova Brigada busca exatamente o anonimato e o isolamento da comunidade super-heroica, cuidando ela mesma de resolver os problemas que acontecem nos bastidores. Dentre os jovens conectados, estão os ex-mutantes Barnell Bohusk (outrora conhecido como Bico) e Angel Salvadore. Ah sim, e para cumprir as missões, eles têm (ou tinham) dois integrantes com superpoderes: a latina esquentada Miss América (que vocês podem ver atualmente na série Jovens Vingadores, que se passa depois de Vingança) e o fanfarrão Nulificador Supremo (não, não é o mecanismo de mesmo nome), cujas pistolas podem anular superpoderes temporariamente – ele também está aparecendo em Jovens Vingadores, mas não do lado dos mocinhos... longa história; aguardem as próximas resenhas da série em breve.



Por sua vez, os Jovens Mestres consideram que a geração atual de supervilões perdeu todo o respeito; deve ser erradicada e substituída por quem faça valer seu nome. Financiados por um benfeitor (ou nesse caso, um malfeitor) misterioso, Executor e Cabeça de Ovo (que já integraram os “Jovens Vingadores” de Norman Osborn durante o Reinado Sombrio) voltam acompanhados pelo patético mas perigoso Rapaz Radioativo, a cínica Cavaleira Negra e o grandalhão Mako – bom, este último não durou muito tempo...



Então o grupo de jovens heróis e o de jovens vilões bate de frente, certo? Não é bem assim: a trama realmente começa quando Miss América descobriu um jovem inconsciente preso numa instalação secreta abandonada. Simultaneamente, um grupo de superseres coordenado por Kyle Richmond (ex Falcão Noturno) começou a investigar o desvio de arquivos confidenciais da SHIELD e uma invasão sobrenatural prestes a acontecer sobre a Terra. O primeiro problema parece levar a Jack Truman, ex-agente da SHIELD; o segundo, ao enigmático Intermediário, o jovem resgatado pela Brigada, com confusas reflexões metafísicas, falas misteriosas e o poder de servir como ponte entre os dois lados da realidade (os leitores mais radicais talvez se lembrem desse personagem em outras histórias, mas ele está bem diferente aqui. E há motivo pra isso).



Invasões de criaturas demoníacas se misturam a um plano de ataque terrorista a uma nação muitas vezes odiada, mensagens de texto trocadas entre adolescentes e aparições sem explicação (como Stacy X está de volta à ativa se ela tinha perdido os poderes e depois morrido?). Parece insano? E é. Mas também é muito legal ver como essa confusão vai se desenvolvendo, como as partes se encaixam umas nas outras. Os flashbacks envolvendo o Caveira Vermelha, por exemplo, podem não parecer acrescentar muito à ação no presente – mas é a revelação por trás deles que mostra ao Nulificador Supremo que nem sempre é possível distinguir Bem e Mal em dois lados opostos.

O único ponto que me desagradou um pouco em Vingança (e que é ínfimo, perto do excelente trabalho não só dos autores da minissérie, mas também da tradução no Brasil) foi que, aparentemente, algumas falas em espanhol da Miss América (que na versão original tem um vocabulário bem sujo) foram trocadas, talvez pela semelhança do idioma com o nosso português e porque para nós fica mais fácil entender o que ela fala do que para os leitores dos EUA. Um exemplo: ao responder de forma atravessada a um comentário da Mulher-Hulk, ela a chama aqui de “chica”. Digamos que, nas edições em inglês, a palavra que ela usou era “um pouco” mais ofensiva que isso... ah sim, para quem lê Jovens Vingadores e não entende por que ela vive ameaçando bater no Loki... bom, digamos que ela tem bons motivos.



Mas é só um detalhe pequeno. No fim das contas, vale a pena ler Vingança? Depende. Para quem espera mais do mesmo, superseres trocando sopapos por qualquer coisa e personagens icônicos, talvez seja melhor procurar outro encadernado. Mas quem está interessado em uma leitura diferente, completamente doida, por vezes difícil de entender na primeira vez, bem, nesse caso Vingança é a revista que você sempre esperou. Uma coisa é certa: dificilmente você vai achar nas bancas algo remotamente parecido.

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