Durante os eventos de A Essência do Medo, as circunstâncias levaram Magma a fazer um acordo com Mefisto em troca da liberdade dos amigos dela, presos no Inferno. Por sua parte na barganha, o demônio solicitou um simples encontro romântico com Amara e. agora, veio cobrar a dívida. A equipe criativa formada pela dupla Dan Abnett e Andy Lanning nos roteiros, David López nos desenhos e Álvaro López na arte-final mostra como foi o encontro desse casal tão “incomum”.
A história começa com os preparativos de Amara, se arrumando para o encontro. Enquanto isso, quase todos os demais Novos Mutantes estão desesperados, buscando alguma maneira de livrar a colega deste fardo. Ciclope, Illyana, Dr. Estranho, Motoqueiro Fantasma e até Hela foram cogitados como possíveis ajudas nessa situação. Mas Amara já está bem conformada e confiante de que será um “simples” encontro quando o seu par chega.
O encontro começa com Amara tentando o tempo todo tomar o máximo de cuidado possível com as palavras que fala, buscando evitar o quanto pode qualquer frase que remeta a algum duplo sentido ou pegadinha, que pudesse ser utilizado contra ela. Enquanto isso, Mefisto demonstra toda a confiança, estando todo sorridente e fazendo piadinhas com múltiplos sentidos.
Esse equilíbrio entre a tensão de Amara e a excessiva auto-confiança de Mefisto chega ao ápice com a tentativa de impressionar ela, levando-a para jantar no terceiro círculo do Inferno (o da Gula) e mostrando praticamente tudo o que ele teria disponível, mansões, serviçais, vulcões, uma vista infernal e até mesmo uma banda particular composta, entre outros, por Amy Winehouse nos vocais e Ludwig van Beethoven no piano!
Isso é o suficiente para desestruturar completamente Amara que entra em desespero, pedindo que ele pare e diga logo o que ela tem que fazer para que ele fique com a alma dela em troca dele deixar os amigos dela em paz. Mefisto tenta demovê-la da ideia, passando a impressão de que é não nada disso que ela estava pensando e que ele realmente queria sair com ela e isso não era uma pegadinha do demônio, mas ela continua a não acredita. E, neste momento, Mefisto faz sua grande jogada.
Ao supostamente abrir seu coração e mostrar suas inseguranças para Amara, Mefisto confessa que também se sente um pouco como uma aberração que quer viver uma vida um tanto mais normal, assim como a mutante. Afinal, o grande segredo do sucesso dele residia no fato de ele ter mente e emoções humanas, de maneira a saber exatamente como os humanos se sentem e poder usar essas fraquezas humanas a seu favor. No entanto, essa mesma vantagem trazia como GRANDE desvantagens o fato de ele próprio sentir essas necessidades humanas ocasionalmente. Por isso, mesmo que por uma noite, ele queria saber como é ter um encontro romântico normal de seres humanos. (Ou não, afinal, está-se falando do demônio encarnado, ele pode estar muito bem simulando).
Toda essa confissão acaba deixando Amara bem mais aliviada e ela acaba aceitando continuar o encontro, agora de uma maneira mais “normal” e explicando os erros que o Mefisto (supostamente) cometeu. Eles jantam em uma lanchonete em São Francisco, em que eles conversam de uma maneira mais natural e um começa a falar sobre o outro. Mefisto passa a ideia de ser um workaholic que é “obrigado” a fazer caridade para que as pessoas vivam mais e, com isso, possam cometer mais atos ruins que os supostamente credenciariam ao Inferno. Amara acaba ficando um tanto impressionada com esse “outro lado” do diabo.
Ao final do encontro, Mefisto a leva para casa e, se ele a agradece por ela o tê-lo tratado como uma pessoa comum, ela o agradece por ele não ter trancafiado a alma dela a um suplício eterno no Inferno. A dívida é encerrada e Mefisto ainda ganha um beijo no rosto por Amara.
Mas, ao final, ele acaba voltando e perguntando se poderia telefonar para ela novamente, o que ela deixa, indicando que a história desse casal ainda não terminou.
Esta é a melhor história dos Novos Mutantes escrita pela dupla DnA em todo o run até o momento. E não deixa de ser tristemente impressionante que é justo a primeira história totalmente em um personagem que não faz parte dos Novos Mutantes. Porque a protagonista não é a Magma. Todas as atenções vão para o Mefisto neste capítulo.
O personagem foi brilhantemente caracterizado, principalmente se levarmos em conta que ele é normalmente retratado como um vilão bem estereotipadamente mal. Aqui, a dupla DnA colocou diversos tons de cinza no personagens para que se tornasse verossímil a possibilidade de ele conquistar Amara Aquilla. Só que a sutileza principal reside no seguinte: ele pode muito bem estar mentindo, mas até o leitor pode ser levado a acreditar na palavra dele porque em momento algum existe um quadro que indique que ele está mentindo ou agindo de má-fé. Como um bom mestre das trapaças, Mefisto fazer Amara e os leitores acreditarem nele. Afinal, o que impediria por exemplo, de a brincadeira sobre “sacrificar virgens após o encontro” fosse verdade, além do fato de ele dizer que era uma piada fora de hora? Em toda a caracterização do personagem e na própria arte, todas as decisões foram muito bem feitas.
Amara foi muito bem caracterizada, finalmente ganhando um pouco mais de destaque e servindo muito bem de escada/par romântico para o Mefisto. Apenas faltou um pouco mais dela falando sobre ela mesma. Seria interessante ver como a personagem se vê no contexto atual e isso foi mostrado em apenas um rápido diálogo.
Os demais personagens praticamente apenas fizeram cota de participação na história. Dani foi o estereotipo da amiga que é tão contra o namorado da outra que beira a hipocrisia (porque chamar Hela para cuidar de Mefisto é só trocar de pacto e de demônio). Mancha Solar não consegue sair das três únicas coisas pelo qual é caracterizado pela dupla DnA: “Sou rico” (essa ele não usou dessa vez), “Sou brasileiro/gosto de futebol” (por isso sempre com uma camisa da Seleção ou batendo uma bola) e “Gosto da Amara” (com uma personalidade tão fraca assim, não é a toa que a Amara preferiu o Mefisto). Nate Grey me faz pensar pelo terceiro arco seguido o que raios ele está fazendo ali. Ele está praticamente sem poderes, sem função na história, os personagens não vão com a cara dele, os escritores parecem que não gostam dele (ou sequer estudaram o personagem!), ele nunca faz nada, praticamente só reclama! Sua inclusão parece mais um mandate editorial que os escritores escracham o tempo todo e que só serve de combustível para os haters desse grande personagem. Cifra e Warlock não fizeram praticamente nada na história toda.
Um fato curioso sobre essa história é uma imediata lembrança com o arco “Corações e Almas” do The Flash da DC Comics durante o run de Mark Waid: Nesse arco, para salvar sua cidade, Flash e sua namorada fazem um arco com o demônio Neron e oferecem em troca o amor que sentem um pelo outro. Por causa desse amor barganhado, Neron acaba passando a ter sentimentos como amor e compaixão incompatíveis/insuportáveis para um demônio. Quaisquer semelhanças com os eventos de Um Dia a Mais e os mostrados nesta história infelizmente devem ser apenas coincidências.
Na arte, David López mais uma vez faz uma arte bela e simples, com boas sacadas humorísticas e caracterizando bem os personagens.
Esta história foi publicada originalmente na edição 37 da revista New Mutants e, aqui no Brasil, saiu em X-Men Extra 136.1.
P.S.: Alguém com mais conhecimentos musicais reconheceu todos os músicos da banda do Inferno?