domingo, 29 de julho de 2012

Em Foco: Ciclo de Vida (Parte 1)

A Iniciativa
De acordo com a Wikipedia, o termo ciclo de vida é definido como "o conjunto de transformações porque podem passar os indivíduos de uma espécie para assegurar a sua continuidade. Algumas definições se referem especificamente ao ciclo de vida do indivíduo, inclusivamente considerando o seu final com a morte do organismo; outras se centram no processo de reprodução sexuada, apesar de referirem os ciclos de vida assexuados". Normalmente, nas aulas de biologia, o conceito é apresentado nas seguintes etapas (e me desculpe Covs e Cammy, biólogos profissionais do site, se o conceito que estou apresentando é simplista): Nascimento, Crescimento, (eventualmente) Reprodução e Morte. Ou podemos reduzir isso ainda mais, para apenas três palavras: Começo, Meio e Fim.

Ok, não se trata de um site sobre organismos vivos, mas sobre personagens fictícios. Assim sendo, as noções de ciclo de vida poderiam se aplicar a esses personagens? Na minha humilde opinião, sim.

Inicialmente, antes que os fãs mais radicais se manifestem, esse texto não é sobre o fim da cronologia, nem mesmo uma comparação entre os mangás e os comics americanos. No entanto, admito que é mais fácil associar a ideia de começo-meio-fim com as histórias em quadrinhos japonesas). No entanto, é errôneo achar que é incompatível a existência de uma cronologia de fatos com personagens com começo-meio-fim definidos. Aliás, penso que a existência de personagens com começo-meio-fim em um universo cronológico como o da Casa das ideias seria muito importante, em termos criativos.


Capitão América


Assim, não estamos aqui discutindo a cronologia (que pode ser entendida como um conjunto de fatos sequenciais importantes para aquele universo) e sim o ciclo de vida dos personagens que compõe esse universo.

Seguindo com nossa exposição, ainda que seja importante que um personagem tenha um ciclo de vida, alguns conseguem escapar das amarras do trinômio começo-meio-fim sem que isso afete a essência deles. Um bom exemplo, nacional por sinal, são os personagens da Turma da Mônica. Enquadrados em um universo que não necessita de cronologia, Maurício de Sousa e sua equipe podem trabalhar livremente as histórias. Não há necessidade de Mônica, Cebolinha ou Cascão passarem por um processo de amadurecimento ou crescimento. Ressalte-se que estou falando dos personagens das histórias ditas “clássicas”, excluindo os personagens que compõe o chamado universo “Jovem”.

Um bom exemplo de personagem em um ambiente mais próximo do nosso, os chamados comics norte-americanos, seria o Superman em seus primórdios. Quando foi criado, os criadores não tinham muita preocupação com uma sequência de eventos. Tudo que interessava era ver Homem de aço bater (e eventualmente, matar) marginais em histórias relativamente simples sem grandes conexões umas com as outras.

Assim, personagens criados em ambientes que a cronologia (sequência de fatos) não tem importância, como o universo da Turma da Mônica, são personagens que costumam fugir esquema começo-meio-fim. Ora, não há mínima necessidade de vermos Mônica amadurecendo, Cebolinha virando adulto, entre outros fatos (isso acontece no universo Jovem, que é diferente do ambiente clássico). São personagens que, de certa forma, permanecem estáticos, sem grandes alterações. Isso não quer dizer que sejam ruins. Apenas essa é uma característica deles. Tanto que os personagens criados por Maurício de Sousa ainda emocionam plateias de todas as idades.

Vingadores Primordiais


No entanto, em ambientes que a cronologia é de extrema importância, a regra são (ou deveriam ser) personagens com começo-meio-fim definidos. Nesse campo, sem querer fazer um exaustivo estudo acerca do tema, podemos dividir esses personagens em dois tipos: 1) Aqueles criados para determinado fim ou objetivo; 2) Aqueles que, por passarem por processos de amadurecimento e envelhecimento, acabam entrando nessa lista.

Exemplos de personagens que são enquadrados no item (1) existem aos montes. Nos mangás, a regras são esse tipo de personagem. Na área dos comics norte-americanos, um exemplo (bom ou ruim, a escolha fica a cargo de vocês) é a criação de Todd Mcfarlane, o Spawn. O personagem é criado para um fim específico. Se ele nunca cumpriu esse destino, é porque ele acaba por padecer dos mesmos problemas que comentaremos mais a frente.

Em um Universo Cronológico como o da Casa das ideias, é um tipo de personagem que acaba criando certos problemas, que podem ser resumidos na seguinte sentença: O que fazer com ele depois que ele cumpre o objetivo? Em geral, acaba virando um estorvo para os editores e para fãs, que não sabem onde enfiar o coitado.

Franklin


Com relação aos personagens enquadrados no item (2), uma grande leva de personagens que compõe o Universo Marvel se enquadram nesse tipo. Um dos mais notáveis exemplos seria o Homem-Aranha. Reparem que Stan Lee, ao criar o personagem, não o tinha criado com um propósito específico (derrotar um vilão, ser o melhor em determinado seguimento e por ai vai). Mas, a partir do momento que o personagem começou a envelhecer (sair do colegial, ir para faculdade, casar) instaurou-se um ciclo de vida. O personagem envelhece como se fosse um ser humano normal.

Uma das grandes sacadas do Universo Marvel é a identificação que nós fãs temos pelos personagens. Nós nos colocamos no lugar deles. Stan Lee concebeu um universo onde foi permitido aos seus moradores envelhecer, passar por fases de amadurecimento, sofrer, dentre outras situações humanas. Em minha modesta opinião, tanto o Quarteto Fantástico como Homem-Aranha são duas das mais revolucionárias criações (para época) do simpático velhinho. Quarteto por estabelecer uma família de heróis que não usavam identidade secreta. E o Homem-Aranha por mostrar a tumultuada vida de um jovem que luta para vencer na vida. Reparem que se, nas histórias do Teioso, a prioridade fossem os sopapos nos criminosos, teríamos mais um super-herói genérico.

Nesse ponto, temos um “problema” : O que fazer com personagens que envelhecem?

Photobucket



Em termos “artísticos” (é extremamente complicado falar de arte na indústria) a solução seria, um dia, as histórias desses personagens acabarem, cedendo lugar para outros. Um bom exemplo disso seria se os Novos Mutantes assumissem o lugar (com liderança e tudo) dos antigos X-Men. Seriam novas ideias, uma nova geração e uma nova forma de olhar a causa mutante. E tudo isso respeitando a sequência cronológica de fatos.

No entanto, não é a solução “artística” a mais conveniente, pelo menos em termos comerciais. Dois fatores emperram isso: 1) fãs, que de um modo geral, não toleram personagens novos; 2) a transformação dos personagens em marcas. Em razão desses fatores, a brilhante ideia de Stan Lee, que criou personagens que poderiam envelhecer e amadurecer, se torna um tanto quanto complicada de se manter. E a solução de acabar com a cronologia ( que é importante tanto para os fãs como para os personagens) é completamente inviável.

Restam assim algumas saídas, que nós fãs conhecemos à exaustao: Sagas cada vez mais revolucionárias (anualmente), retcons, ressurreições, pactos estranhos, alterações de realidade e, na mais radical das situações, um reboot de todo o universo.Todas essas situações já se tornaram corriqueiras, que podem ser enquadradas como regras dos comics americanos. Táticas que podem ser definidas como uma espécie de antienvelhecimento dos personagens.



Surpreendentes X-men

Impedir o envelhecimento das "marcas" é a regra atualmente. Reparem que nos somos fãs de personagens que foram criados a pelo menos 50 anos ou mais, em alguns casos. Personagens que entretinham a geração dos nossos pais ou avós. Exemplo de longevidade? Tenho as minhas dúvidas. Não posso negar que esses "velhinhos" sejam extremamente carismáticos, mas é estranho nada parecido tenha surgido nos últimos tempos. Surgiu, mas nunca conseguiu se estabelecer nos mesmos moldes.

É claro que eu sou suspeito para falar isso (eu, por exemplo, acho que o rock de verdade se encerrou com o movimento Grunge. Sempre que tentam me apresentar uma banda nova falo que parei em 1994...), pois adoro os personagens que estão na Marvel e, no mais das vezes, não sou fã de novos personagens. Aliás, contribuo muito com esse processo de antienvelhecimento proposto pela Marvel. Gosto de algumas ressurreições, gosto de algumas sagas revolucionárias anuais e gosto de retcons. E ainda pago por tudo isso.

No entanto, abro espaço para um olhar crítico da situação, pois entendo que evitar o envelhecimento do seu universo, não admitindo que os personagens conheçam seu ocaso, também cria muitas situações ruins. Em alguns casos, não permitir o envelhecimento dos personagens acaba por estragá-los ou infantilizados, jogando por terra anos de amadurecimento.


Pais e filhos

Como devem ter percebido, o tema ainda será debatido mais vezes, inclusive focando em alguns personagens (na verdade, o foco era sobre um só personagem, mas preferi desdobrar o tema em uma série de “Em Focos”). Infelizmente, não posso garantir uma periodicidade, mas tentarei fazer essa série de ”Em Focos” com alguma regularidade. Espero que vocês apreciem a leitura.

Rafael Felga


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