domingo, 21 de outubro de 2007

Guerra Civil: A frente de Batalha vista de baixo


Civil War: Front Line #1

Seguindo um pouco a linha do especial de Dizimação Geração M, no qual Sally Floyd, jornalista do jornal Alternativa, faz sucesso com uma série de entrevistas com ex-mutantes atingidos pelo Dia M, além de ser assediada e ameaçada por um desses mesmos "desmutanizados", temos O Incrustado, talvez o mais importante arco de histórias a compor Guerra Civil: Frente de Batalha. Nesta narrativa, a cargo de Paul Jenkins nos roteiros e Ramon Bachs nos desenhos, veremos a Guerra Civil de um outro ponto de vista. Ao invés de enxergar o conflito com os olhos dos envolvidos diretos – heróis pró e contra registro, governos dos EUA e, claro, os super vilões –, percebemos como as pessoas comuns, através da perspectiva de Sally e do repórter do Clarim Diário, Ben Urich, encaram toda a confusão gerada por essa repentina caça aos não-registrados. Pegos no fogo cruzado da disputa que dividiu o Universo Marvel em dois, cabe aos repórteres narrarem e investigarem tudo que puderem para, assim, entenderem o que de fato se passa nessa Guerra Civil.

A história começa com os dois repórteres, e muitos outros, presentes no enterro de John Fernandez. Quem? John era um dos cinegrafistas que acompanhava os Novos Guerreiros na segunda temporada de seu Reality Show, morrendo tragicamente com a explosão causada por Nitro em Stamford. Já conversando em um bar, onde todos bebiam em homenagem ao colega caído, notamos um pouco a posição inicial de ambos em relação ao registro, quando a lei estava nas vésperas de ser aprovada. Urich vê um pouco de razão na aprovação do projeto, concordando com seu chefe reacionário, JJ Jameson. Já Sally, que é nitidamente contra registro, recebe total liberdade para expor como o registro é, em sua opinião, mais uma violação dos direitos civis disfarçada de lei federal.

Guerra Civil: Frente de Batalha

E cada um segue seu caminho. Urich chega na redação do Clarim no dia seguinte, onde tem uma reunião rápida na qual o incidente de Stamford e a lei de registro parecem a mina de ouro de um jornal que sempre malhou a maioria dos heróis. Ben parece um pouco incomodado em fazer exatamente o que lhe mandam, ir à coletiva marcada pelo Homem de ferro, não tendo liberdade de dar sua própria direção a suas reportagens. Robbie o lembra que, no Clarim, a prioridade é vender o jornal e escrevê-lo como JJJ quer.

Em casa, ainda remoendo o falecimento da filha mutante, Sally recebe uma visita inusitada. O Homem-Aranha, um dia antes de revelar sua identidade ao público, a procura dizendo que gostou de suas reportagens sobre os ex mutantes. O Aranha diz que ela parece ser a pessoa certa com quem falar. Em uma rápida entrevista, ele pede que Sally publique que, diferente do que muitos pensam, os heróis têm outras preocupações. Têm família, uma vida particular, tocando justamente no ponto que mais aproxima civis e heróis: a identidade secreta. Ele vai embora, pedindo que ela escreva o quanto os heróis têm que pagar um alto preço para protegerem os outros. Que as pessoas precisam saber disso. Ao sair, dá a dica sobre a coletiva do Homem de Ferro, na qual mais tarde Peter se revelaria.

Guerra Civil: Frente de Batalha

Na coletiva, vemos apenas uma repetição do discurso Homem de Ferro que prenunciou a revelação do Homem-Aranha, na qual ele confirma ser Tony Stark, e ainda um alcoólatra. Acaba a primeira parte.

Na segunda parte já podemos ver a repercussão da revelação de Peter no Clarim. Urich é ostensivamente assediado por colegas de imprensa, que tentam pescar qualquer informação sobre o ex-colega de redação. Ben se esquiva e, no elevador, tenta entrar em contato com Parker para conseguir uma exclusiva. Peter aparece dentro do elevador, provavelmente entrando pelo vão no teto, e concorda em ceder a entrevista. Porém, bufando de raiva, JJ Jameson rejeita sua publicação, mesmo quando Robbie diz que, se registrando, Peter estava fazendo o que o próprio chefe apoiava. Mas não importa. JJ está morrendo de raiva, sentindo-se enganado por todos os anos em que teve o Homem-Aranha trabalhando para si.

Guerra Civil: Frente de Batalha

Vemos ainda a ex-nova guerreira e ex-vingadora Angelica Jones, a Flama, desistindo da vida de heroína por se recusar a revelar sua verdadeira identidade, enquanto toda a questão do registro é tratada como um circo pela mídia. Não vale mais a pena todo o trabalho.

No fim dessa parte, Sally e Ben testemunham o início das atividades da caça aos heróis não registrados. Prodígio, um dos Slingers, grupo que assumiu as quatro identidades heróicas criadas por Peter Parker em sua "Crise de Identidade" (publicada nos tempos da Abril), discursa bêbado do alto de um prédio contra a nova lei. Interpelado pelo Homem de Ferro assim que bate meia-noite (lembram que os agentes da SHIELD aparecem na casa de Luke Cage também nesse horário?), ele diz que não é como Tony, que nada no dinheiro e pode revelar sua identidade a qualquer um. Chamando-o de traidor, avança sobre o vingador dourado.

Facilmente derrotado, sob os gritos de "fascistas" de Sally, Prodígio é preso, equanto, em off, Urich narra o acontecimento, constatando que tudo isso, mais uma vez, não está em mãos civis, mas dos "poderosos". Eles têm o controle. Mas, diferente do que se pode pensar, aqueles que pagarão mais caro por essa briga de gato-e-rato de enormes e perigosas proporções são elas, as pessoas comuns.

Guerra Civil: Frente de Batalha

A terceira parte nos traz três momentos, três perspectivas interessantes. Sally consegue acesso ao esconderijo de vários heróis anti-registro. Não, não falamos dos Vingadores Secretos do Capitão América, mas de heróis pés-de-chinelo. Os mais "notórios" são Solo, Estrela Negra e Alfabeto. O resto é daí para baixo. Mas a repórter quer exatamente isso. Uma visão fora do comum do conflito. Alfabeto parece exercer liderança no grupo, que está a procura de um contato com os homens do Capitão, e admira Sally por ela contar a sua história.

A primeira coisa que fica claro agora é que, cada vez mais, a carreira de vigilante solitário está em vias de extinção. Primeiro, porque os heróis registrados dificilmente agiriam de forma solitária, sem ajuda de outros heróis e agentes da SHIELD, o que diminui a chance de fracasso. Já os anti-registro... bem, eles precisam uns dos outros para se protegerem daqueles que os caça. Sally pergunta porque Alfabeto, cuja identidade já é pública, preferiu a clandestinidade. Ele fala que foi um soldado, viu seu irmão morrer no campo de batalha, que lutou por seu país, e não admite que nele comecem a criar entraves à sua liberdade. Quando Sally diz que o registro pode ser uma forma de proteger a população, Solo retruca, dizendo que se as regras mudassem cada vez que um louco explodisse algo, matando vários civis, quem venceria seria o agressor. Por fim, o que parece ser a opinião de todos lá é que todos os heróis não podem pagar pelo que os Novos Guerreiros fizeram de errado.

Guerra Civil: Frente de Batalha

Saindo dos subterrâneos, vemos Urich entrevistando um dos figurões dos pró-registro. Ao falar com Reed Richards, Ben pergunta porque ele tem certeza que o registro é o correto. Reed mostra algumas projeções, baseadas em estatísticas, que indicam o crescimento catastrófico de ameaças super-poderosas para além do eixo Nova York/Los Angeles, caso essas atividades continuem sem a devida coordenação. A certeza do Sr. Fantástico, mais uma vez, está nos números, mesmo que esse seja o terceiro motivo diferente que ele dá para ser pró-registro. Urich pergunta se há possibilidade de ter tanta certeza que projeções numéricas são previsões do futuro, fazendo uma comparação com o fato de que mesmo no Beisebol, esporte fundamentado nas estatísticas, o resultado de um jogo pode ser inesperado. Lembra que atividade humana, especialmente em sociedade, não é determinada só com números, que é imprevisível e indeterminada.

No terceiro momento temos Sally presenciando uma luta de mais dois heróis "obscuros" – Trovoada e Bantam –, cada um de um lado da dicotomia criada em torno do registro. Uma ação mal calculada do anti-registro Trovoada lança Bantam (pró-registro) contra um caminhão-tanque. Sem reação, Trovoada faz como Sally, seu amigo fotógrafo Geoffy Cresswell e várias testemunhas, presenciando embasbacado a tentativa de resgate. Mas o que vêem é só um corpo quase carbonizado ser encontrado. O agressor lentamente deixa o local em estado de choque. Mais uma baixa de guerra. Mais uma família, na perspectiva de Sally, que perde um ente querido.

Guerra Civil: Frente de Batalha

Por fim, chegamos à quarta parte. Mais uma vez Sally e Ben se encontram e, tomando um café, ela diz que o que presenciou na noite anterior era uma perfeita propaganda para os pró-registro. Tão perfeita que parecia armada para acontecer. Urich tenta alerta-la para que se concentre em relatar o que vê, ser menos parcial, pregando uma inexistente imparcialidade quase asséptica. Ela diz que não vai fazer vista grossa ao que ela desconfia ser interesses "secretos" dos pró-registro. Alguém está ganhando com isso tudo.

Com Ben pedindo para que ela não faça nenhuma besteira, os dois se despedem e se separam. Com seus próprios pensamentos, ele demonstra uma veia jornalística menos impulsiva e mais conservadora do que sua amiga. O que ele achava ser o certo a se escrever, só deveria ser feito quando tivesse condições de sustentar aquilo incondicionalmente. Era necessário esperar tudo se revelar. Sua reflexão é interrompida por um bilhete que ele encontra em seu carro: "Mais perto do que você pensa. Escute-a". Uma ameça?

Sally volta ao esconderijo dos heróis c-list, que estão já em maior número, mas ainda não têm contato com o Capitão América. E nem há tempo, já que os heróis registrados, liderados pelo Homem de Ferro e acompanhados por agentes da SHIELD descobrem-nos. É um "massacre". Em meio à confusão, a maior preocupação parece ser proteger Sally. A civil. Os poucos que escapam a levam com eles, mas a maioria é pega. E seu destino é a prisão 42.

Guerra Civil: Frente de Batalha

Sally liga para Ben e dá o alerta: os jornalistas devem estar sendo rastreados. Só assim para encontrarem os esconderijo dos heróis. Ele não leva muita fé, mas, em seguida, a cena final do arco nessa edição de Guerra Civil Especial. Urich encontra uma caixa com uma abóbora dentro. É ele. Norman Osborn, o Duende Verde. O vilão maníaco que Ben ajudou a desmascarar, e que está sedento por vingança. Mas ele estava preso, como se libertou? Não podemos deixar de pensar nos "Thunderbolts bizarros" vistos no fim de Guerra Civil 4. Mas, antes disso, em uma história chamada O Programa, publicada originalmente em Civil War: Front Line 2, vemos agentes da SHIELD mostrando a revelação do Homem-Aranha ao prisioneiro Norman. "Verde" de raiva, ele destrói a TV e a cadeira em que está preso. Os dois agentes, acreditando que Osborn estava "estimulado" o suficiente, fazem uma proposta para que ele jogue pelas "novas regras". Seria o ataque a Ben algo planejado pelos pró-registro, ou só pela SHIELD? Por quê? Na próxima edição começam os esclarecimentos.

Guerra Civil: Frente de Batalha

O Incrustado nos traz, portanto, uma visão pouco convencional nas HQs das grandes editoras. Buscando explorar tudo o que um evento da magnitude de Guerra Civil tem a oferecer, olhamos as coisas de baixo para cima, colocando o contingente dos heróis de primeira linha em segundo plano, buscando visões múltiplas dos espectadores, ou dos participantes periféricos de todo o conflito. É, em minha opinião, o que de melhor o especial Guerra Civil: Frente de Batalha tem a oferecer. Falaremos mais dessa história em breve.


« Jøåø »

comments powered by Disqus