quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Em Foco: Os Super-Poderes e a Aids

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Hoje, dia 1º de dezembro, é o Dia Mundial de Luta Contra a Aids. Dada a importância da data, decidimos não deixá-la passar em branco. Embora a temática esteja longe de ser das mais populares no mundo dos super-heróis, não é de hoje que alguns escritores mais ligados nos assuntos sérios do mundo real puseram um pé na vanguarda e trataram do assunto nos quadrinhos da Marvel. São esses breves e importantes momentos que vamos relembrar agora.

Jim Wilson

Sendo um dos poucos amigos do Hulk e sobrinho do Falcão, Jim foi um coadjuvante frequente nas histórias do gigante verde desde 1970. Em 1991, quando Peter David era o roteirista do Incrível Hulk, Wilson convenceu o amigo Rick Jones a fazer um show no centro de apoio a portadores do HIV onde trabalhava. Quando os dois se encontram, ele revela ao músico que também está infectado pelo vírus e que perdeu a namorada por conta disso. Jim também conta que um chefe da máfia chamado Lang tem capangas encarregados de matar Jefferson Wolfe, namorado de longa data de seu filho Tyler Lang. O mafioso culpa Wolfe por seu filho ter AIDS, e também por ele ter a aparência mais saudável que a de Tyler.

Enquanto os dois enfrentavam a ofensiva de Lang, Jones teve as mãos feridas, enquanto Wilson sofreu uma lesão no peito. Nisso, foi explorado o medo de contágio, com Rick temendo tocar o ferimento de Jim.

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Vários meses depois, Jim volta a aparecer na revista do Hulk, apanhando de um grupo de pessoas que protestavam por um menino soropositivo ter ganhado o direito de frequentar uma escola pública. O próprio Hulk o resgata do ataque e providencia cuidado médico de alta tecnologia. É quando o alter-ego do Dr. Banner descobre que Wilson tinha AIDS e que no momento sofria de pneumocystis carinii, uma rara pneumunia comum nos pacientes com AIDS na época, e tinha baixa expectativa de vida.

Jim Wilson propõe que o Hulk doe a ele seu sangue, na esperança de que isso pudesse curar sua condição, mas o medo de Banner em criar outro monstro como ele (conforme já havia ocorrido na transfusão de sangue que originou a Mulher Hulk) o impediu de atender o pedido. Houve uma encenação com o Hulk fingindo fazer uma tranfusão e Jim fingindo que acreditava. Pouco depois, ele falece.

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Além de explorar o psicológico do Hulk/Banner, a decisão também serviu para manter a questão da AIDS num nível realista, com a condição permanecendo sem cura conhecida. Após a morte do jovem, Banner doa uma altíssima quantidade de dinheiro para o centro de apoio onde ele trabalhava, a fim de garantir sua existência por anos a fio.

O caso Beaubier

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Desde seus primeiros dias como personagem de histórias em quadrinhos, nas mãos de John Byrne, Jean Paul Beaubier, o Estrela Polar, nunca se interessou muito por mulheres. Dizia-se que era devido a sua grande dedicação à carreira de atleta do esqui ou coisas do tipo, mas deixar sua homossexualidade subentendida era mesmo a intenção de Byrne, principalmente porque, à época, era proibido pelo Código dos Quadrinhos e por pressões sociais a existência de um super-herói abertamente gay.

O que isso tem a ver com a AIDS? Acontece que, na segunda metade dos anos 80, o escritor da mensal da Tropa Alfa Bill Mantlo começou a mostrar um Estrela Polar doente, com tosses cada vez mais fortes. O ano era 1987 e, nessa época, era exatamente esse o tipo de sintoma relacionado à AIDS, devido ao mesmo tipo de pneumonia que o já citado Jim Wilson teria alguns anos depois. O caso do sobrinho do Falcão já mostrava a quebra da crença de que a AIDS seria uma "doença gay", já que Jim era heterossexual, mas a situação era diferente em 87.

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A AIDS tinha acabado de ser descoberta e era descrita como uma doença que afligia jovens homens homossexuais, que eram a grande maioria dos infectados. Assim sendo, como a mídia da época, Mantlo decidiu que as tiradas irônicas em suas histórias que deixavam cada vez mais óbvia a homossexualidade de Jean Paul não era suficientes e que a forma pela qual ele revelaria que o Estrela Polar é gay seria mostrando-o infectado pelo HIV. Ou seja, se tem AIDS, é gay. Era essa a linha de raciocínio comum à época.

Durante algumas edições, as tosses de Jean Paul foram piorando e ele se sentia cada vez pior. Ele chega a confessar à sua irmã Aurora que ainda não consultou o médico da equipe por temer as notícias que ele poderia lhe dar, comportamento típico de quem teme ser soropositivo. Quando finalmente toma coragem de consultar o médico, praticamente conformado de que morreria em breve (pois na época a expectativa de vida de pacientes de AIDS estava por volta dos 6 meses), ele tem o azar de o doutor se tonar um supervilão e tentar destruir a equipe. Quando o vilão é derrotado, o Estrela Polar desmaia, sucumbindo à sua condição, ao fim da edição 49 da revista Alpha Flight. O plano original de Bill Mantlo era mostrar a morte de Jean Paul na edição 50, pondo as cartas na mesa ao chamar sua doença de AIDS e a ele de homossexual.

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Porém, os editores da época não deixaram a edição 50 seguir esse caminho e Mantlo foi obrigado a mudar radicalmente a direção da história. O que acabou acontecendo foi: a Tropa Alfa sai em busca de uma cura para o colega de equipe enquanto Loki (ele mesmo, irmão do Thor) surge para os gêmeos Beaubier e conta que a mãe dos dois era uma fada (ou elfo, que são praticamente o mesmo na mitologia), que foi assassinada após dar à luz por ter "sujado" o sangue de sua raça. Acontece que Jean Paul sentia-se mal porque o sangue puro que corre em suas veias tinha dificuldade em sobriver num reino impuro como a Terra. Ele é curado pela luz mágica da terra dos elfos que o poder de sua irmã continha e, ao fim da história, vai viver na terra mágica de seus antepassados por um tempo. Tempos depois, o escritor Peter David comentou ironicamente que "então ele não era gay, era uma fada. Isso é muuuito melhor."

Apesar desse episódio um tanto frustrante, o tema não desapareceu. Em 92, sob os roteiros de Scott Lobdell, o Estrela Polar ouve um choro de bebê durante uma luta da Tropa Alfa no centro de Toronto e encontra uma menininha abandonada num beco. Ele a leva ao hospital mais próximo, onde ela é diagnosticada com AIDS, tendo sido infectada no útero. Jean Paul a adota, dando-lhe o nome Joanne Beaubier. Com isso, a Tropa Alfa passa a fazer diversas campanhas sobre a AIDS e a importância de se falar sobre o assunto. Semanas depois, a menina morre nos braços do Estrela Polar. Isso o leva a convocar uma coletiva de imprensa no dia seguinte e relevar que é gay, na esperança de que sua posição de celebridade e modelo de comportamento aumentasse o interesse da mídia sobre a AIDS, para que houvesse mais informação, principalmente sobre prevenção.

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E Karen Page?

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Ela era a jovem e inocente secretária e namorada de Matt Murdock, o Demolidor. Depois de problemas pessoais, resolveu tentar a carreira de atriz. Trabalhou em uma novela, mas acabou tornando-se uma atriz pornô viciada em heroína. Com o tempo ela largou o vício e a carreira no mundo da pornografia, mas esse momento em sua vida acabou gerando consequências. Em 1999 (2000 no Brasil) a aclamada saga Diabo da Guarda na revista do Demolidor escrita por Kevin Smith mostrou uma Karen desesperada ao descobrir ser portadora do vírus HIV.

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Entretanto, o exame era falso e fazia parte de um grande jogo psicológico do vilão moribundo Mystério, que queria um feito memorável antes de morrer. Apesar disso, Karen não teve a chance de descobrir se tinha mesmo o vírus ou não, pois foi assassinada antes. A dúvida acabou ficando no ar, sendo que o mais provável é que ela não fosse mesmo soropositivo, já que seu namorado Matt não foi contaminado e a situação foi arquitetada por um supervilão. De qualquer forma, já podemos perceber aqui uma mudança do paradigma de que a AIDS é uma doença que causa morte muito rápida, o que obviamente é um reflexo direto da visão da sociedade, mudada com os avanços no tratamento da doença que já haviam ocorrido. Já se sabia que é possível ser soropositivo e ter uma vida normal, sendo que um portador do vírus pode viver anos sem ter consciência de que o possui.

Além desses casos, já foi brevemente citada em uma revista do Pantera Negra uma tia da Tempestade que teria morrido de AIDS, embora pouca informação tenha sido dada. E falando nos pupilos de Charles Xavier, um fato bem bizarro é que os mutantes da Marvel são imunes à AIDS. Houve nos anos 90 a história do Vírus Legado, uma doença seríssima que acreditava-se ser exclusiva dos mutantes e depois passou a infectar humanos comuns, algo que muitos consideram uma analogia ao HIV. Depois de perder a atenção nas histórias, o vírus acabou sendo curado.

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Enquanto pensava no que exatamente escrever para finalizar o artigo, percebi que o Coveiro, aqui do 616, tinha mais o que dizer sobre o assunto e resolvi propor que ele fechasse o texto. Ele aceitou:

"Bom, quando o Léo me pediu para deixar um último paragrafo de orientação para o final de seu artigo, lembrei recentemente de ter lido um artigo sobre o assunto, apontando que a situação da doença, principalmente no Brasil, poderia estar muito mais contornada se por acaso não tivesse havido um desleixo por parte da população em se precaver. Parte disso se deve ao fato de que, com os avanços do tratamento, a doença que antigamente matava em meses passou a dar uma sobrevida de anos e anos aos acometidos. Isso levou lentamente a AIDS a sair do foco da mídia e campanhas governamentais como grave problema. No entanto, isso não significou que as pessoas deixaram de morrer, afinal, nem todos respondem tão bem ao tratamento contra AIDS.

Além disso, muitos ainda só descobrem que estão com AIDS depois de um bom tempo infectados, o que leva ao segundo problema da questão: a desinformação. Muita coisa mudou sobre o que se conhece da doença desde seus primórdios. Se por um lado as campanhas fortalecem o uso da camisinha, esquecem os meios envolvendo transmissão por perfuro-cortantes. E não é algo restrito aos usuários de drogas como muito apregoam, já que há sim risco de transmissão durante o processo de tatuagem, aplicação de piercing ou qualquer tipo de 'microcirurgia" sob condições suspeitas.

Na verdade, o ideal é estar consciente e tirar todas as suas dúvidas com profissionais ou sites adequados. Recomendo particularmente este site, mas estive espiando uma versão em português que você pode ver clicando aqui que serve bem. Numa nova abordagem, hoje classificamos as chances de se ter a doença pelos 'Comportamentos de risco'. Ou seja, tudo depende do jeito como você se porta, diminuindo os riscos não só para você, mas para todos a sua volta."

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A doença permanece sem cura e, devido ao fato de que uma pessoa pode ter o vírus e não saber, é imprescindível que qualquer pessoa que já tenha tido comportamento de risco faça o exame para saber se é ou não soropositivo, para garantir o próprio tratamento e a prevenção de contágio a outras pessoas.

Léo

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