segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

X-Force: Hipocrisias

A X-Force pode ter vencido sua batalha contra Volga, mas a guerra em nome da proteção dos mutantes está longe de acabar: o multimilionário russo inescrupuloso continua à solta vendendo seus perigosos armamentos antimutantes, e quem pensa que ele é a maior ameaça por trás dos bastidores não poderia estar mais enganado...



Antes de começar essa resenha, peço desculpas aos leitores pela longa demora para a resenha das três histórias a seguir – afinal de contas, a primeira saiu na edição 018 de X-Men Extra, há cerca de cinco meses... Vocês têm todo o direito de se incomodar com isso, mas espero que não tenham perdido o interesse nessa série. Porque sinceramente, X-Force é uma das coisas mais legais que eu já li em muito tempo.

Bom, a primeira história traz Simon Spurrier no roteiro e Rock-He Kim na arte, e mostra um momento de descanso da X-Force em sua base, num aeroporta-aviões naufragado da SHIELD. Para se distrair de seus problemas, Psylocke resolveu flertar com Cable – ou melhor, com o clone dele do dia, já que o verdadeiro está em sono criogênico e seus clones morrem cerca de um dia após serem criados. Perturbador, sim, assim como o sexo virtual entre “MeMe” – vulgo Esperança Summers – e Fantomex. Longe dali, em um restaurante, vemos Doutor Nêmesis tentando informar Medula (cujo cabelo agora é azul, a propósito) da maneira mais sensível que as experiências de Volga nela a levarão a uma morte acelerada. A personalidade racional e arrogante dele entraram em choque com a insanidade dela, mas uma amizade inesperada surgiu quando os dois descobriram a paixão em comum pelo café.

Nesse meio-tempo, descobrimos por onde Dominó andava desde que as duas X-Forces anteriores se desfizeram: ela foi mandada por Cable em uma missão para investigar o misterioso grupo Olho Amarelo. E, antes de ser capturada, ela descobriu que não se tratava de uma organização qualquer: para começar, eles tinham mecanismos para controle mental, em que o controlado obedece a todas suas vontades enquanto suas mentes viviam seus maiores sonhos, a ponto de muitas pessoas e criaturas se submeterem a esse processo voluntariamente.



Mas o pior é que o líder da Olho Amarelo (não vou contar quem é, e espero que ninguém estrague a surpresa nos comentários, mas a história dá várias dicas de que se trata de um velho conhecido nosso) tem microcâmeras em insetos espionando todos os mutantes – e aqui entra a primeira justificativa para o título dessa resenha, porque ao mesmo tempo, o clone atual de Cable decide que a X-Force precisa espionar todos os humanos que possam representar uma ameaça aos mutantes. Quando os mocinhos usam a mesma tática dos bandidos, o que isso diz sobre eles?

(ah sim, ao final de cada dia, Fantomex mata o clone mais recente de Cable sem o resto da equipe saber)

A segunda história (mostrada em X-Men Extra 019 e 020, com a mesma equipe criativa, começa de forma bem inusitada: em vez da X-Force, vemos um misterioso grupo militar britânico do MI-6 chamado Depenadores de Faisão em missão para combater os terroristas Quadees num país chamado Wajiristão. Ao longo dos dias, eles são atacados várias vezes... e, aos poucos, vamos percebendo que os terroristas são um tanto familiares. E que os soldados não são pessoas comuns. Quando os militares são localizados por Pete Wisdom, Gloriana (vulgo Meggan Braddock) e Excalibur (vulgo Faiza Hussain), do MI-13, tudo fica às claras: os Depenadores tinham superpoderes conseguidos ilegalmente com Volga, e o grupo misterioso que vinha atacando o esquadrão não eram os Quadees, mas a própria X-Force.



Como de costume, isso levou a uma briga entre os três grupos, mas ela acabou logo, quando perceberam que os verdadeiros Quadees aproveitaram a confusão para sequestrar a desagradável agente Melinda Argyll, líder dos Depenadores. Quando todos se uniram para enfrentar os terroristas, nova surpresa: os Quadees também tinham negociado superpoderes artificiais com Volga. Ah sim, lembram que as tecnologias do russo causam a morte do usuário em poucos dias? Pois é, isso também vale para seus novos usuários, mas Argyll não mencionou essa parte para seus subordinados (novamente, “mocinhos” agindo como bandidos). Azar o dela, que acaba abandonada por Psylocke e MeMe na base dos terroristas ao ter seus segredos revelados, e no final, o jovem e patético cadete Tom revela-se uma megabomba humana, desintegrando todos os Depenadores e Quadees – não sem antes Esperança projetar em sua mente memórias felizes como um gesto carinhoso para o mártir.

Em troca da ajuda, Wisdom revelou a Cable que o MI-13 também conhecia a Olho Amarelo, e ao contrário da X-Force (mas não dos leitores), descobriu que eles usavam insetos para espionar cada mutante no planeta.

Como localizar a Olho Amarelo, se Dominó foi capturada? A solução encontrada envolveu o desconhecido X-Man Longedosolhos (mostrado na última história de X-Men: Legado, e que eu considero pessoalmente um dos melhores X-Men criados em muito tempo). O problema é que ninguém se preocupou em explicar para o cara que precisavam de sua ajuda; em vez disso, resolveram caçá-lo como se fosse um animal. O que é mais fácil na teoria do que na prática, já que basta que ele saia do seu campo de visão para todos esquecerem que ele sequer existe.



Essa perseguição é mostrada em X-Men Extra 021, com roteiro de Spurrier e arte de Tan Eng Huat, rendendo momentos hilários, como Doutor Nêmesis gravando mensagens para o grupo lembrar de retomar a perseguição, enquanto se elogia e insulta Medula (que xinga o Nêmesis da mensagem gravada, mas não aquele ao seu lado), ou Fantomex tentando deter seu alvo... jogando um croissant nele. Nessa brincadeira de gato e rato, Longedosolhos percebeu que os membros da X-Force são todos pessoas com sérios problemas, vários deles autodestrutivos.

Quando ele pensava em partir, foi convencido a ajudar pelos integrantes mais racionais na base da X-Force: as máquinas. Sério. Após entender que as intenções de seus perseguidores eram boas, ele deixou Nêmesis suprimir seus poderes temporariamente, para que um dos insetos da Olho Amarelo o detectasse, fosse implantado com um rastreador e voltasse à base dos vilões quando seus poderes voltassem e o inseto se esquecesse de sua existência... só que, quando tirou o supressor, ele continuou vigiado. Fantomex apareceu com a solução assassinando o pobre mutante a sangue frio, o que finalmente fez Longedosolhos ser esquecido pelo inseto... e por todo mundo exceto pelos robôs, removendo seu corpo durante a faxina.



Com isso, vemos o quanto a definição de “herói” é questionável em X-Force. Por um lado, fico triste que um dos personagens mais promissores do universo X em muito tempo (e provavelmente a única figura que apareceu na série até agora que realmente mostrou as virtudes esperadas de um herói) seja eliminado sem chance de crescer aos olhos dos leitores. Por outro, essa cena serve para reforçar o caminho autodestrutivo (seja física, mental ou sobretudo moralmente) em que todos os membros da equipe se encontram.

No fim das contas, minha única crítica é em relação à arte de Huat na história de Longedosolhos: por algum motivo, gosto muito da arte de Kim, mas a de Huat parece um tanto malfeita. De resto, só posso dizer que cada edição da X-Force de Spurrier me empolga como poucas coisas que eu li nos últimos anos, principalmente pela forma orgânica como a história evolui. Não há uma edição que não contribua para o andamento da trama, não há um arco que comece e termine sem consequências mantidas ao longo da série, e pequenos detalhes que podem parecer banais muitas vezes se revelam de grande importância algumas edições depois (creio que a única outra história recente que tenho lido com esse mesmo aspecto seja a chamada Supersaga do Fim do Mundo, que envolve determinadas edições da Turma da Mônica Jovem).

Por não envolver personagens extremamente populares ou equipe criativa com nomes de peso, e por seu começo nada convencional, infelizmente essa versão da X-Force deve terminar sua existência com poucos leitores. Se servir de consolo para o Spurrier, pelo menos um leitor extremamente satisfeito ele tem.

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