quarta-feira, 9 de setembro de 2020

Grandes Histórias Marvel do Brasil: O Teste da Marvel com a Pandora Books

Em 2001, a Mythos já publicava as revistas da Marvel, com outra visão editorial. O contrato entre a Abril e a Marvel já chegava ao fim. A Marvel, que já era licenciada através da Panini Itália desde os anos 1990, optou por encontrar outra editora no Brasil. Uma dessas editoras foi à recém-criada Editora Pandora Books. A nova editora, fundada em 2000, tinha como administradores os editores Leandro Luigi Del Manto (que já tinha deixado a Editora Globo), Maurício Muniz e Ricardo Giassetti. O foco da Pandora, a princípio, era com a publicação das revistas inglesas 2000AD.  A Panini acabou cedendo algumas revistas da Marvel para serem publicadas pela Pandora, porém, foram poucas as publicações. A primeira edição lançada pela Pandora foi o especial “Wolverine Rio de Sangue”, com uma aventura do mutante canadense no Brasil. A capa foi feita pelo brasileiro Roger Cruz. Outro lançamento foi o Almanaque Marvel, com histórias do grupo mutante Geração X, Justiceiro, Deadpool e a Garota-Aranha (filha de Peter Parker e Mary Jane, de uma realidade alternativa, que assumiria o manto de seu pai, depois do mesmo ter abandonado o uniforme do Homem-Aranha). 

Almanaque Marvel teve somente três edições publicadas. Também foi publicada, pela Pandora, a minissérie X-Men& Clandestino, de Alan Davis, em duas edições. A série também ganharia uma edição encadernada. A Pandora ainda publicaria o encontro entre os personagens Marvel com os da Wildstorm, com o especial “Gen 13 & Quarteto Fantástico”. Outra coleção publicada foi uma pequena coleção chamada “Pandora Books Apresenta”, em cinco edições. Dentro dessa coleção, somente as edições nº 02 e 05, com histórias da Marvel, com as edições “Marvels Zero” e o especial “Justiceiro Massacra o Universo Marvel”, aventura escrita por Garth Ennis, que apresenta a sua versão do fim do Universo Marvel pelas mãos do Justiceiro.                                                                                                                                                        


O editor Leandro Luigi Del Manto comenta sobre esse curto período da editora e o teste feito pela Panini. “Na Pandora, a nossa meta era publicar material da 2000AD. Começamos com Zenith, Juiz Dredd e Halo Jones, mas não era o momento. O grande trunfo da época foi ter publicado Sin City, A Liga Extraordinária, Almanaque Marvel e o Capitão Bretanha. Foi uma época de transição, uma época confusa, o material estava sendo publicado pela Abril e quem licenciava o material já era a Panini. A Panini estava tentando encontrar algum parceiro no Brasil. O pessoal da Panini chegou a falar com a gente se tínhamos condições de produzir o material da Marvel, mas não tínhamos estruturas para isso, e acabou passando para a Mythos. Alguns títulos publicados pela Pandora foram testes, antes de haver essa transição de tirar as coisas da Abril e passar para a Panini Brasil.  Eles testaram algumas editoras e passaram alguns materiais para nós, como o especial do Justiceiro e Wolverine Rio de Sangue”, revela Leandro Luigi Del Manto.

 


A seguir, um depoimento do editor Maurício Muniz: “A Pandora foi uma tentativa minha, do Leandro Luigi Del Manto e do Ricardo Giassetti em fazer uma editora de quadrinhos como achávamos que deveria ser, após o fechamento da Atitude/Tudo em Quadrinhos, na qual trabalhamos sob ordens do Leão Azulay. A ideia era trazer bons materiais e esperar atrair os leitores com eles. Como conhecíamos bastante o material gringo, sabíamos quais títulos não estavam sendo lançados aqui. Assim criamos o Almanaque Marvel, que tinha Justiceiro, Garota-Aranha, Deadpool e outros. Trouxemos X-Men/Clãn Destino (que acho que foi o primeiro gibi dos mutantes a sair com um palavrão aqui, o Wolverine solta um "caralho", se não me engano), e o Almanaque que teve só três edições”, lembra Maurício Muniz. 

 



Mesmo tendo um período curtíssimo com a Marvel, a Pandora pelo menos tiraria um coelho da cartola. Uma das revistas editadas pela empresa e muito surpreendente, diga-se, foi a minissérie “Arquivos X-Men: Capitão Bretanha”. O personagem foi criado pela Marvel e publicado na divisão inglesa da Marvel UK nos anos 1970, tendo algumas de suas histórias iniciais escritas por Chris Claremont. Depois de algumas histórias de pouca expressão, o cultuado roteirista inglês Alan Moore assumiria os roteiros da série. Alan Moore, que ganharia fama mundial com as suas séries escritas na DC Comics, como Watchmen, V de Vingança, Monstro do Pântano e diversos outros clássicos modernos, criaria um pequeno clássico perdido na Marvel, em 1981. A história desenhada por Alan Davis mostra o personagem em um mundo paralelo, onde todos os super-heróis foram chacinados por uma máquina de matar, chamada Fúria. Preso nesse mundo, o Capitão Bretanha procura uma maneira de não ser morto e voltar para casa o quanto antes. Essa seria a única vez que o mago inglês trabalharia com algum personagem do Universo Marvel. O conceituado roteirista inglês, antes do Capitão Bretanha, tinha escrito algumas histórias curtas do Dr. Who, que foram editadas pela Marvel UK. 

Tempos depois, a Marvel decidiu republicar a série do Dr. Who, sem uma prévia autorização do autor, e alguns problemas envolvendo pagamentos atrasados com a série do Capitão Bretanha fizeram com que Moore rompesse com a Marvel em definitivo. Com todos esses problemas, Alan Moore, dono das histórias do Capitão, não autorizou a republicação dessas aventuras durante um bom tempo, fazendo com que a série do Capitão Bretanha ficasse esquecida, perdida no tempo. Somente em 2001, o roteirista daria permissão para a série ser publicada em uma edição encadernada, desde que fosse creditado, também, como proprietário sobre os direitos das histórias do Capitão. Por esse motivo que Capitão Bretanha foi publicado no Brasil com anos de atraso pela Pandora Books.

A série foi prometida pela Pandora Books em cinco edições, mas seria publicada em quatro números. A série ainda ganharia também uma versão compilada com todas as quatro edições.       

 


“Capitão Bretanha do Moore, que é um dos melhores trabalhos dele com super-heróis. Era um material meio complicado, porque no início as histórias não eram do Moore, então tínhamos meio que dizer ao leitor que "aguentem que a coisa melhora no próximo número". Foi muito legal trabalhar com a Marvel naquele momento, mas a crise econômica ferrava tudo, com vendas bem baixas. Tantos que os últimos dois números do Bretanha saíram por um acordo com a loja Comix, que comprou toda a tiragem”, lembra Maurício Muniz.

Em 2004, a Pandora acabara por fechar em definitivo, e teria um papel decisivo em relação ao direcionamento que a Panini Itália tomaria com as revistas do Universo Marvel no Brasil. Infelizmente, a Pandora não conseguiu passar no teste, e toda a produção das futuras revistas que seriam produzidas no Brasil iria parar novamente nas mãos do editor e dono da Mythos, Hélcio de Carvalho. Mas a Abril ainda estava com o contrato em vigor, e no ano 2000 a editora mudaria totalmente a sua linha dos heróis pela redação, com a nova linha Super-Heróis Premium - a linha que definiria o destino da Marvel na editora de Victor Civita.


Alexandre Morgado

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Alexandre Morgado é cartorário do 15° Tabelionato de São Paulo. É também autor do livro "Marvel Comics - A Trajetória da casa das ideias no Brasil", livro que narra a história da Marvel em nosso país, publicado em 2017 pela Editora Laços. O autor possui um acervo gigante de HQs, principalmente com material da Marvel Comics.


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