terça-feira, 28 de janeiro de 2020

Em Foco: E o longínquo ano de 2020 chegou...



Recentemente, tivemos a noticia de que a Marvel  lançou uma nova revista do Homem-Ferro, mas dessa vez, no lugar de Tony Stark, temos Arno Stark como portador da armadura e com ele, um novo Homem de Ferro: O Homem de Ferro 2020. O personagem em si não é novo, já que o Homem de Ferro 2020 é um dos vilões que aparecem numa clássica minissérie do Homem-Máquina, escrita por Tom DeFalco e desenhada por Barry Windsor-Smith. 

No ano de 1984, a dupla concebeu a minissérie do Homem-Máquina retratando um futuro longínquo de 36 anos a frente. Passada em setembro de 2020, a história mostra Aaron Stack ressurgindo após um longo período adormecido (desmontado), em meio a uma disputa de um grupo de rebeldes contra uma grande Corporação, a Baintronics, comandada por Sunset Bain, uma das adversárias do Homem-Máquina. Aqui falaremos um pouco da minissérie, fazendo alguns paralelos com 2020 da vida real.

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Ainda que haja certas correspondências com o mundo atual, o mundo imaginado pela minissérie não previu certos avanços tecnológicos proporcionados pela Internet. E da mesma forma, certos avanços tecnológicos ainda não se concretizaram, como os carros e motos voadores. Mas, algumas coisas que a minissérie apresenta, como robôs, inteligências artificiais e dificuldade de acesso à tecnologia por parte de certos setores da sociedade, são muito atuais.        

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Como já dito, na minissérie de 1984, Aaron Stack ressurge em meio a uma Nova York dominada por uma grande corporação, a Baintronics, chefiada por Sunset Bain, uma produtora de armas que, ao longo do tempo, foi uma de suas adversárias. No cenário apresentado pela história, a produção em massa de robôs começou no final da década de 1980, passando por protestos anti-máquinas ao longo da década de 1990. No começo do século 21, os protestos foram silenciados (pelo governo) e uma alta regulação sobre o comércio de robôs garantiu o monopólio para Bain. Desse modo, os rebeldes sucateiros amigos de Aaron Stack são comerciantes ilegais de peças. 

De certo modo, estamos atravessando período que, na minissérie, compreenderia o período de ascensão da utilização dos robôs (final de 1980) e questionamentos sobre a tecnologia (1990), em especial nas linhas de produção. Desde a década de 1970 já usamos máquinas na linha de produção de automóveis, por exemplo. E, com isso, trabalhos que demandariam 10 pessoas passaram a exigir apenas 5. E conforme a tecnologia avança, menos pessoas são demandadas para aquele tipo de atividade. E como precisamos de menos pessoas, menos empregos são gerados.


Também é importante destacar que o momento atual é de uma explosão tecnológica das chamadas inteligências artificiais. Ainda que não tenhamos máquinas parecidas com Aaron Stack (mas talvez não demore tanto), a inteligência artificial, em sua diversidade de uso, tem impactado todos os campos da vida humana. A chamada revolução industrial 4.0 tem virado do avesso as vidas das pessoas deste diminuto planeta. E não só no que diz respeito aos empregos, mas também no campo político e pessoal.

Na minissérie, depois de um intenso período de revoltas, houve a imposição de uma regulação à produção tecnológica. No nosso mundo real, o debate sobre a regulação da tecnologia tem sido muito intenso, ainda mais com surgimento de algoritmos capazes de colocar palavras na nossa boca (conhecidos como deepfakes) ou mesmo criar um rosto real que não existe, mas com todas as características de uma pessoa comum. Além disso, bots e utilização de dados podem distorcer resultados de eleições e opiniões, criando um cenário em que nada mais é real e ninguém é mais confiável.

Em termos de legislação e regulação, a que mais se destaca no campo, atualmente, é a GPRD (cuja sigla significa  General Data Protection Regulation), aplicada no âmbito da União Européia, cujo equivalente brasileiro é a LGPD, sigla para Lei Geral de Proteção de Dados, que deve entrar em vigor no presente ano. O objetivo da legislação é proteger os dados pessoais de má utilização por parte de empresas e do governos das esferas federal, estadual e municipal.  Mas talvez seja necessário mais. Recentemente, o CEO da Google, Sundar Pichai defende uma regulação equilibrada das inteligências artificiais, de modo a evitar os efeitos nocivos da tecnologia. 

De volta para minissérie, a regulação da produção e comércio dos robôs levou a completa dominância de uma única empresa, a Baintronics Inc, cuja CEO é Sunset Bain, inimiga do homem-máquina. No gênero Cyberpunk, não é incomum a dominância por apenas três ou quatro corporações, seja do poderia econômico, seja de alta tecnologia (que costumam viver em guerra). Em nossa realidade atual, também não é muito diferente.

 

A despeito do surgimento de inúmeras startups de tecnologia, o grande poderio está com empresas como Alphabet (dona do Google), Facebook e Apple. Há também as empresas chinesas Xiaomi e ByteDance (dona do aplicativo mais popular entre os adolescentes no momento, o TikTok) o que adiciona não só uma competição tecnológica, mas geopolítica, entre governos e suas corporações tecnológicas.

Também é interessante destacar o papel do grupo que acolhe Aaron Stack. Com a regulação e monopólio da Baintronics, nem todos tem acesso à tecnologia. Em uma das primeiras cenas da minissérie é justamente esse grupo procurando peças para montagem e venda de robôs para aqueles que não tem possibilidade acesso. No dias atuais, a despeito de alta tecnologia, muitos ainda não tem acesso aos benefícios tecnológicos, em razão dos custos. Um exemplo disso é área da saúde que, conforme os anos passam, fica cada vez mais tecnológica e cara, com cada menos pessoas conseguindo acesso a bons tratamentos.

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Quem lê a minissérie sabe que ela é o produto de um tempo em que surgiram diversas histórias mostrando futuros distópicos, pós-guerra nuclear (em geral entre EUA e URSS), dominado por grandes corporações de tecnologia. Foi, durante a década de 80 que um dos chamados subgêneros da ficção científica, o Cyberpunk, ganhou destaque e se desenvolveu. Se a ficção científica, desde Júlio Verne, imaginava como seria o futuro, o filhote Cyberpunk também cumpre esse papel, ainda que de forma mais agressiva, pessimista e estonteante.

Na década em que a Casa das Ideias lançava a mini da dupla DeFalco e Barry, o gênero, como já dito, ganhou destaque. No mesmo ano de lançamento da mini (1984), era lançado Neuromancer, clássico de William Gibson, que retrata um mundo dominado por conglomerados tecnológicos, inteligências artificiais quase humanas e cowboys de console que andam pela matrix (nada a ver com filme, mas o filme foi altamente inspirado pelo livro) e pelo cyberespaço. Dois anos antes, os cinemas recebiam o clássico Blade Runner (baseado em um famoso livro de Philp K. Dick), no qual era mostrado a história do detetive Rick Deckard caçando replicantes rebeldes em uma caótica Los Angeles. Quatro anos depois, em 1988, a animação japonesa Akira (baseada no mangá de Katsuhiro Otomo, que começou a ser publicado em 1982) chegava aos cinemas, mostrando uma Neo-Tóquio de 2019, preparando-se a receber os Jogos Olímpicos de 2020 (que, de fato, acontecerão em Tóquio), em meio a guerra de gangues, experiências genéticas e poderes paranormais. 

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As histórias do gênero Cyberpunk tem um cenário altamente distópico que, de alguma forma, são a expressão do que seus autores sentiam em relação ao momento atual. A década de 80, apesar da lembrança colorida de alguns, despontava um cenário bastante aterrador. Os índices de criminalidade nas principais cidades americanas eram altíssimos (isso, de certa forma, explica o sucesso de produções como Máquina Mortífera e Duro de Matar). EUA e URSS pareciam que iriam explodir o mundo em uma guerra nuclear. Fome entre as nações africanas, a despeito de algumas ações sociais, não pareciam ter fim. Além disso, o surgimento da AIDS foi um dos grandes desafios da medicina na época.   

De 1984 até 2020 foram 36 anos de diversos acontecimentos. Não passamos por uma Guerra Nuclear entre URSS e EUA. Ainda não temos veículos voadores. Máquinas como as que aparecem na minissérie ainda (bastante atenção ao ainda) não estão disponíveis no mercado. Mas temos corporações de tecnologia que lucram com manipulação de dados, inteligências artificiais que podem acabar com reputações alheias e, cada vez mais, governos investem em tecnologia de vigilância em massa.  

Se Aaron Stack acordasse em uma realidade como a nossa, após um período de “sono” e depois de atentamente  se atualizar dos últimos 36 anos,  é provável que ele pediria para ser novamente desmontado, para voltar ao seu descanso desse mundo atribulado que vivemos.

Bom 2020 a todos! 

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