quinta-feira, 1 de outubro de 2020

OS 80 MAIORES MOMENTOS DA MARVEL COMICS NO BRASIL - Parte 2

Estamos completando 80 anos de produções Marvel no Brasil e começamos nessa semana uma série em oito partes falando sobre os 80 principais momentos das publicações dos heróis da Casa das Ideias que valeram um destaque. Depois da primeira parte falando sobre histórias da era de ouro, passamos aqui a segunda parte com o começo de fato das publicações com selo Marvel no Brasil:

12- A era Marvel chega ao Brasil pela Ebal em 1967.

 Stan Lee precisava fazer algo acontecer, pois a editora em que trabalhava há mais de 15 anos estava minguando. Lee convidou Steve Ditko, desenhista que já tinha feito alguns pequenos trabalhos, e que estava atrás de trabalhos maiores. Outro que retornaria era Jack Kirby.  Logo depois do sucesso com o seu Capitão América, Jack Kirby e Joe Simon saíram da Timely, após alguns desentendimentos com Martin Goodman.   Kirby fez alguns trabalhos na DC, além de diversas outras editoras, e após 17 anos desde a sua saída da Timely, o REI estava de volta. Com o pedido de Goodman de criar uma revista, Stan Lee, com 38, Jack Kirby, com 44 e Steve Ditko com 34 anos de idade, juntaram o que foi a Timely e a Atlas e deram o pontapé inicial no que viria a ser o Universo Marvel. 

O início do Universo Marvel tradicional se dava ali, com a primeira edição da revista do Fantastic Four nº 01 (Quarteto Fantástico), que chegava às bancas em novembro de 1961. No Brasil, quem começou com o projeto foi à empresa Standard, uma das maiores agências de propaganda do Brasil. Hoje, a empresa pertence à multinacional Ogilvy. Naquela época, contudo, era uma empresa 100% nacional.      

O representante da Standard, Mário Resende, era uma pessoa "antenada” com o que rolava nos Estados Unidos. E como a Standard possuía a conta dos postos de gasolina Shell, logo criaria um bom pacote para o lançamento dos novos super-heróis Marvel.  Paulo Adolfo, um dos filhos de Adolfo Aizen, em uma viagem aos Estados Unidos, visitou a agência Transworld Features Syndicate, que fazia a distribuição das revistas Marvel.                   

Paulo Adolfo percebeu o enorme sucesso que a Marvel tinha alcançado juntos aos jovens americanos, e conversou com um dos representantes da agência sobre a possibilidade da Ebal publicar os heróis Marvel no Brasil. Chegando de viagem, logo conversaria com seu pai sobre a novidade. A Ebal foi uma das primeiras editoras a negociar diretamente com algumas das editoras americanas. Coisa rara naqueles tempos, já que era com agências brasileiras como a Record e a APLA que, geralmente, as editoras nacionais fechavam negócios. 




Após alguns meses, as editoras entravam em acordo para o lançamento dos novos heróis.  Com tudo já encaminhado entre a Ebal e a Marvel, a Standard, por intermédio de Mário Resende, entraria em contato com a Ebal, para apresentar um projeto envolvendo o lançamento das novas revistas, com distribuição dos postos Shell. A Standard, por meio dos postos de gasolina, criaria um dos grandes trabalhos de marketing para a divulgação das novas publicações dos personagens Marvel.    

E assim, motivados pelas crianças que assistiam os desenhos animados daquela época, os seus pais seriam levados a abastecer seus carros nos postos de gasolina, em troca dos novos gibis. Ao abastecer nos postos Shell, o motorista levava as primeiras revistas em quadrinhos dos novos heróis Marvel. Eram as revistas Capitão Z, com as histórias do Capitão América e do Homem de Ferro, o Álbum Gigante, com as histórias do poderoso Thor, e Super-X, com as histórias de Namor, o Príncipe Submarino, e o Incrível Hulk. Todas essas revistas eram as edições número zero, no formato 18x26, em preto e branco.


13- A primeiríssima aparição do Homem-Aranha nos quadrinhos. Álbum Gigante nº 11 da Ebal de agosto de 1968.

O personagem mais icônico da Marvel enfim chagava ao Brasil com a história publicada em The Amazing Spider Man n°28, com os desenhos de Steve Ditko. Não para menos, essa edição é uma das mais disputadas pelos colecionadores. 


14-O primeiro indício da confusão no Brasil, Super-X nº 17 de janeiro de 1969.

 Como a Ebal não quis adquirir todos os personagens do Universo Marvel, acabou abrindo precedentes para a concorrência no Brasil. E uma curiosidade aconteceu na edição nº 17 na história do Hulk, em que o gigante esmeralda se encontra com o Surfista Prateado.                     

A curiosidade fica por conta do Surfista, que nessa edição é chamado de "Acrobata do Cosmo".  Na abertura da história, a Ebal chama o personagem de “Acrobata Aquático” - talvez aqui cometendo um tremendo erro de revisão, ou então fazendo uma alusão entre a prancha do personagem com o mar. No decorrer da história, o personagem é tratado como Acrobata do Cosmo. Nesse caso, a mudança drástica no nome foi para não ter problemas com a editora Paulista GEP, de Miguel Penteado. A editora que já estava publicando as histórias solos do Surfista em suas publicações. 



15- A Editora GEP de Miguel Penteado, a segunda editora a editar a era Marvel em 1969.

 Quando a Ebal começou a publicar o universo Marvel, nem todos os personagens do primeiro escalão foram aproveitados. Alguns deles ainda não eram de conhecimento geral. E para a Ebal, naquele momento, só interessava trabalhar com os personagens que apareciam nos desenhos animados (Hulk, Namor, Capitão América, Homem de Ferro e Thor). Como a Ebal não tinha um acordo de exclusividade (apenas verbal) com as publicações Marvel, já que algumas das histórias eram compradas direto das agências que negociavam as publicações com as editoras brasileiras, alguns personagens foram oferecidos a outras editoras pela APLA.  É o caso dos X-Men, do Surfista Prateado e do Capitão Marvel, que foram publicados pela Editora GEP, do experiente editor Miguel Penteado no final dos anos 1960.


16- Nick Fury pela Trieste de maio de 1969.

A Ebal já estava perdendo gás com os heróis Marvel. A expressão "Continua no próximo número" começava a incomodar os leitores. A APLA ofereceu outras revistas Marvel para a Ebal, que não se interessou. Quem se interessou foi a Editora Trieste, que já publicava “Lili, a Garôta Modêlo”, e Kid Colt. A editora Trieste era localizada na Rua Dr. João Alves de Lima, n° 72, bairro do Brás, em São Paulo. Em 1969, a Trieste começou a lançar outro personagem Marvel: Nick Fury, Agente da S.H.I.E.L.D. Criação de Stan Lee e Jack Kirby em 1963, Nick Fury foi um dos heróis americanos a combater os nazistas na Segunda Guerra Mundial. Anos depois, se tornaria o superespião e agente de elite da S.H.I.E.L.D. Após o final das atividades da Editora La Selva, Estevão La Selva, um dos filhos do fundador da Editora, Vito Antônio La Selva, fundou a editora Trieste, em 1968. A Editora Trieste publicou a fase magistral do grande desenhista Jim Steranko. Editada em 1969, “Nick Fury, Agente da S.H.I.E.L.D.” teve 14 edições. Mas somente os oito primeiros números com as histórias de Nick Fury. A Trieste publicou também alguns almanaques com Nick Fury.


17-O Homem-Aranha ganha revista própria pela Ebal em abril de 1969.

A Ebal sempre promovia concursos e pesquisas em suas revistas. Uma das que a editora promoveu foi uma votação entre os seus leitores, pedindo para que todos votassem em seus personagens preferidos. A notícia do resultado foi publicada em Álbum Gigante nº24. E deu Homem-Aranha na cabeça, seguido por Superboy e Tarzan. A pesquisa envolveu leitores entre oito e vinte anos de idade. Por essa pesquisa não é difícil dizer que, além do personagem mais querido, o Homem-Aranha era a revista Marvel mais vendida pela Ebal. Sua tiragem passava dos 100 mil exemplares por mês. Em abril de 1969, o Homem-Aranha faria a sua estreia na sua própria revista. O personagem não participava dos primeiros desenhos animados. E mesmo assim, foi de longe o personagem que mais fez sucesso naquele período da editora. A editora publicou quase toda a fase de Stan Lee e Steve Ditko. Com exceção de Amazing Spider Man números 21 e 22.


18- A Ebal traz uma nova revista, dessa vez um novo personagem, “O Demolidor” em abril de 1969.

 A próxima publicação mensal que a Ebal mandou para as bancas, em abril de 1969, era a revista do Demolidor, com roteiros de Stan Lee e desenhos de Bill Everett, mostrando as histórias publicadas em Daredevil de 1964. O nome Demolidor não é a tradução direta do original Daredevil. Vale ressaltar que o nome Demolidor foi criado pela própria Ebal.                                                                                          

A edição de estreia conta a origem do personagem e as primeiras aparições dos personagens secundários: seu amigo de infância e sócio da advocacia “Nelson & Murdock”, Foggy Nelson, e a sua secretária Karen Page, que no futuro teria papel fundamental para as histórias do personagem. Um fato curioso no personagem foi o de que, em suas primeiras edições, seu uniforme era vermelho e amarelo. Somente a partir da edição n°07 americana o personagem adotaria o uniforme vermelho por completo. Só que a Ebal ignorou esse detalhe, e coloriu o personagem de vermelho em suas capas desde a primeira edição.                         




19-Enfim, a revista mensal do Quarteto Fantástico em janeiro de 1970 pela Ebal.

 O Quarteto Fantástico ganhou a sua própria revista, dentro da publicação chamada “Estreia”. A primeira edição conta com as histórias publicadas em Fantastic Four nº 13. A revista da primeira família Marvel não pegou os leitores no Brasil. Um dos fatos foi à ordem de publicação da Ebal que não seguiu a ordem das revistas, dificultando um pouco as aventuras cientificas do primeiro grupo da Marvel. A revista durou apenas 21 edições. 



20- A primeira revista em cores publicada no Brasil. Capitão América nº 1 em 1970. 

 A partir do cancelamento de boa parte da revista Marvel, a Ebal abriria mão de quase todos os personagens. Portanto: Hulk, Namor, Thor, Demolidor, Homem de Ferro e o Quarteto Fantástico migraram para outra editora, no começo dos anos 1970. Todos esses personagens seriam publicados pela mais nova editora carioca, chamada GEA (Grupo de Editores Associados). A Ebal ficaria apenas com o Homem-Aranha, que vendia muito bem. E com o Capitão América, que ganharia algumas edições em cores. Essa revista do Capitão América em Cores foi à primeira edição colorida Marvel feita no Brasil. Com um acabamento gráfico muito caprichado, o próprio Aizen se encarregou de enviar para os escritórios da Marvel a sua nova edição em cores, a fim de mostrar o trabalho que estava sendo feito no Brasil. Era a edição em cores nº 01 do Capitão América. Essa edição chegou até as mãos de Stan Lee, que ficou fascinado pela qualidade da edição brasileira. Stan, em contato com Aizen, disse que essa edição era a “melhor revista impressa que já tinha visto”.        

 Após receber a revista, Stan Lee propôs a Aizen que a Ebal imprimisse as edições americanas no Brasil. Seria um tremendo passo para Adolfo Aizen. A Ebal seria a responsável por imprimir todas as revistas originais da Marvel, em uma qualidade superior à que era produzida nos Estados Unidos. Mas a ideia não sairia do papel. Adolfo Aizen o desestimulou, informando que o custo seria muito alto. Como Aizen comprava o papel e pagava em dólares, entendeu que seria muito caro em produzir em grande escala as revistas americanas no Brasil, acabando de vez com as pretensões de Stan Lee.  Capitão América em cores teve apenas 09 edições publicadas, entre 1970 e 1973.


Terminamos por aqui as segunda parte dessa grande cobertura sobre 80 grandes momentos desses 80 anos. Cobre as primeiras aparições dos mais famosos heróis pela primeira vez no Brasil e termina com a primeira revista colorida publicada. Fica de olho agora no Domingo que voltaremos com a terceira parte.

Alexandre Morgado

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Alexandre Morgado é cartorário do 15° Tabelionato de São Paulo. É também autor do livro "Marvel Comics - A Trajetória da Casa das Ideias do Brasil", livro que narra a história da Marvel em nosso país, publicado em 2017 pela Editora Laços. O autor possui um acervo gigante de HQs, principalmente com material da Marvel Comics.

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Nota de agradecimento ao site Guia dos Quadrinhos por ajudar na pesquisa e dispor de imagens de capas para ilustrar esse artigo.

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